A Porta Dos Sonhos Fechada
Bem eu irei tentar resumir o melhor possível o que se passa com o cinema Girasol. Faço-o porque o cinema Girasol significa muito mais que o sítio que passa filmes. É um símbolo social da vila. É o sítio onde muitos casais, de Vila Nova de Milfontes, hoje já com filhos, alguns até netos, tiveram o primeiro contacto com a 7ª Arte, onde deram o primeiro beijo, ou onde pela primeira vez se aventuraram a agarrar a mão de uma rapariga, no escurinho, porque no fundo pensava-se que no “escurinho do cinema” as coisas tinham outra magia… e de facto tinham! Era no Girasol que fomentava-se a imaginação em busca da criação dos sonhos.
Peço que você leitor, e muito provavelmente, residente de Vila Nova de Milfontes, mergulhem nas vossas memórias e se lembrem do centro social e choque de culturas que o recinto em frente ao Girasol proporcionava às gentes da vila e também aos veraneantes. Quiosque de madeira azul e branco, pessoas na esplanada, pessoas a se debruçarem entre os livros, jornais e revistas do quiosque de ferro, o barulho da máquina de bordar do Aquadrilos, o som da bola dos matraquilhos a bater na madeira, as “chinesisses” que lá havia a venda… o que é feito disto tudo? Principalmente onde para o motor disto tudo que era o Cinema Girasol?
A Banalização
A principal razão de como hoje se encontra os conteúdos multimédia, e não falo só dos filmes, é a banalização, generalização, que ocorreu junto de todos nós através de televisão por satélite, é a televisão por cabo, são as SmartTV ,é o Youtube, são computadores, tablets, enfim, a multimédia tem-nos ruído em todas as partes do nosso corpo. Em todo o sítio temos acesso a um filme, música ou vídeos.
Existem várias razões para a banalização que ocorreu com os títulos no grande ecrã. Para ser de mais fácil entendimento vou apontar algumas razões sincronizada com o passar dos tempos.
Televisão, ainda era monocromática, e já incluía na programação os filmes. Com a evolução da televisão abraçamo-nos ao mundo das cores e assistimos à tradicionais tardes e noites repletas de filmes. Mas não parou aí. A multimédia vende e é um mercado em expansão.
Criaram-se canais que passam filmes 24 horas por dia, cassetes (VHS), criaram-se DVDs, criaram-se alugueres de filmes através do serviço pago de televisão, como por exemplo o Meo VideoClube. Ora bem, enquanto se criavam videoclubes virtuais, e totalmente digitais, centenas de clubes de vídeos fecharam portas. A moda do comodismo, e lei do menor esforço, em aceder a conteúdos multimédia propagou-se mais rápido do que um vírus.
Portanto, vamos rever as maneiras de acesso fácil a filmes:
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Serviço pago de Televisão:
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VideoClubes Interactivos;
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Canais de Filmes (Hollywood, TVCine, etc.)
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DVDs Físicos:
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Distribuição Low Cost em Jornais, Worten, Fnac, etc.
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Pirataria.
Com isto a 7ª Arte ou se lançava para ter algo exclusivo, cinema digital e em 3D, ou estava condenada à inevitável morte na praia, mas nem todos os cinemas conseguiriam seguir o barco de investimentos estranbólicos e de condições logísticas muito más. O Girasol foi um deles.
A Solução?!
Do meu ponto de vista, existem algumas soluções para que o cinema Girasol volte a florir e, assim, abrir a portas dos sonhos para toda a gente. Uma dessas soluções seria a união em massa da população, fazendo assim pressão, com um abaixo assinado junto da AdC, entidade reguladora da concorrência, para que o monopólio da Lusomundo, hoje Zon Lusomundo, seja investigado pois eles abusam da denominada “posição abusiva e dominante do mercado”, e assim, talvez a Zon Lusomundo fosse obrigada a mudar as suas práticas de acesso ao aluguer de títulos à 2ª e 3ª semana.
Outra, possível, solução seria a intervenção de autoridades com maior estatuto social, e consequente mais poder, intercederem junto das entidades intervenientes nesta situação, refiro-me à Zon Lusomundo, Associação Portuguesa das Empresas de Cinema e Autoridade da Concorrência.
António Feliciano, proprietário do cinema Girasol, tem travado um longa batalha junto das distribuidoras em busca de uma solução que minimizasse o risco ao cinema digital através de investimento avultado, o custo do projector digital ronda os 110 mil euros. Mas até agora, sem sucesso. A única ponta de esperança foi agora o volte-face da Columbia, detida pela Sony, que acedeu ao pedido de aluguer de títulos à 2ª ou 3ª semana. Mas atenção a Columbia produz 20 a 30 títulos por ano, o que é manifestamente pouco para o funcionamento de um cinema. Mas por mais esforço, persistência e resiliência de António Feliciano, ele perante as grandes empresas do cinema em Portugal, não passa de um mero explorador de cinema assim como tantos outros pelo pais.
Portanto aqui o que quero realçar é que, por exemplo, o presidente da câmara de Odemira, José Alberto Guerreiro, seria uma pessoa de estatuto e poder suficiente para interceder junto da partes intervenientes neste rol bem montado, e bastante lucrativo, da Zon Lusomundo. Ele não é um zé qualquer, ele é o representante máximo da população do concelho de Odemira e, principal responsável pelo defesa dos interesses da população do concelho logo com certeza que com um pequeno esforço da câmara poderíamos ter repercussões sociais bastante positivas pois o cinema não é só um sítio de negócio, é um acesso à cultura, à cultura cinematográfica.
Vila Nova de Milfontes e o Cinema
Enquanto que na vila toda a gente, por certo, já se deve ter questionado o “Porquê” das portas fechadas do cinema são também os habituais veraneantes que já vão comentando “Mais um ano que o cinema está fechado”.
Enquanto que nós, Milfontenses, suspiramos pela reabertura do Girasol de norte a sul do pais assiste-se ao “fenómeno” multiplex. O multiplex é o espaço, comum a quase todos os centros comerciais, que tem elevado número de salas de cinema com horários bastante alargados onde são exibidos muitos títulos e em várias sessões até à exaustão.
Permitam-me também acrescentar que se nada for feito em função do cinema Girasol, avançaremos rapidamente para a vila dos Mil Mamarrachos. O cinema Girasol sem activadade além de ficar com um pátio exterior sem vida, irá contar 272 cadeiras vazias para todo o sempre e com isto engrossar a lista de mamarrachos juntando-se ao Hotel do Pedro e Montavani, embargado, e ao ‘Novo Quebramar’.
Na minha opinião é um pena, para não dizer uma grande tristeza, ver o cinema Girasol cair na aceitação das gentes de Vila Nova de Milfontes como não tendo nenhuma esperança na solução do problema e assim cair no esquecimento. Gostaria de deixar uma ressalva para a volta que o destino proporcionou a António Feliciano, uma vida de trabalho e sacrifício, para quem sabe, ver o projecto de uma vida morrer lentamente, diria mais, diria que seria o “fim” mais inglório que o vendedor de sonhos poderia ter.
Marco Matos
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